Salão de Ideias com Natasha Félix e Renato Noguera, bate-papo sobre Graciliano Ramos e lançamento de livro sobre Rita Lee foram outros destaques da agenda neste início de semana literária internacional
Assuntos como poesia, sonhos e o reencontro com a comicidade balizaram a Conferência do humorista e escritor Gregório Duvivier na 23ª FIL (Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto), na noite desta segunda-feira (5). Na sala principal do Theatro Pedro II lotada, Gregório estabeleceu uma troca divertida e inteligente com a plateia, sem perder de vista reflexões e questionamentos sobre a forma de conduzir a vida cotidiana. A partir do mote da valorização de situações e acontecimentos considerados insignificantes no dia a dia, Duvivier usou seu próprio ofício como pano de fundo para falar sobre a vida, a ludicidade, o Brasil e suas contradições e sobre a importância do fazer e gostar de coisas que não “valem nada” na lógica da dívida, abrindo espaço para a lógica da dádiva.
“É legal sairmos da ideia do acúmulo e entrarmos na esfera do encantamento, retomando nossa capacidade de sonhar”, disse o humorista. Duvivier não deixou escapar referências poéticas de diferentes autores brasileiros, reforçando o poder das palavras. “Nascemos engraçados, mas vamos perdendo essa graça ao longo da vida. Vamos esquecendo o poder das palavras”, salientou. No encerramento, uma fala sobre o país. “O Brasil é um país em construção, em invenção. Um país que a gente precisa aprender a sonhar com ele”, finalizou.
Pensar é um ato cardíaco!
Outro espaço concorrido no dia foi o auditório Meira Júnior, para o Salão de Ideias com o filósofo Renato Noguera. Com mediação festiva da poeta e slammer Roberta Estrela D’Alva, Noguera abordou a questão central do que é e para que serve a Filosofia - a partir do papel central do afeto nas relações humanas. “Mais que mercadorias, o que trocamos com os outros o tempo inteiro é afeto. O pensamento é um ato cardíaco, um ato afetivo”, disse na abertura de sua participação. O movimento de instigar a plateia com reflexões bem ao gosto da ciência filosófica foi escolhido por Noguera para inserir na conversa recortes da Filosofia Africana, da qual é pesquisador. “Na visão africana, não há cisão entre alma e corpo. Os afetos são divididos em primários, como o medo; secundários, como a ansiedade; e terciários, como os pensamentos. Somos seres narrativos e afetivos”, disse o palestrante, também escritor, dramaturgo e roteirista de histórias infantis.
Na abordagem levada pelo público sobre relacionamentos gerais, Renato Noguera foi contundente ao afirmar que em todas as esferas, as relações humanas são desafiadoras porque exigem disponibilidade para amar e para a troca que isso implica. “E elas se tornam difíceis porque as pessoas não têm energia afetiva para essa troca e para lidar com os limites próprios e do outro. O amor é afeto catalisador de bem estar e a gente se organiza pelo amor. Mas no déficit de reconhecimento, a gente grita”, finalizou.
Música no livro
O rock e sua rainha brasileira foram o tema do bate-papo com a jornalista e pesquisadora musical Chris Fuscaldo e Júlia e Bárbara Bartsch, filhas do músico ribeirão-pretano Henrique Bartsch, autor do livro “Rita Lee mora ao lado: uma biografia alucinada da rainha do rock”, que teve lançamento de nova edição na FIL. No auditório da Biblioteca Sinhá Junqueira (BSJ), o público conheceu um pouco mais sobre o processo de produção da obra e sobre o autor, falecido em 2011, engenheiro civil que se dedicou à construção musical no Grupo Nós.
Responsável pelo resgate e reedição do livro, Bárbara Bartsch contou que sempre foi importante para ela fazer uma homenagem ao pai. “Como não toco, nem canto, encontrei na reedição do livro a oportunidade para essa homenagem”, disse a caçula de Henrique, que se surpreendeu ao saber que Rita Lee era para ser chamada Bárbara. Essa história foi contada por Henrique Bartsch em entrevista ao ex-jogador Sócrates, exibida na Biblioteca Sinhá Junqueira. Outros vídeos e várias fotografias mostradas sintetizaram a cronologia da vida pessoal do autor e revelaram curiosidades da relação dele - e da família -, com a roqueira mais famosa e querida do Brasil.
Doutora em Literatura, Cultura e Contemporaneidade, Chris Fuscaldo falou sobre sua relação com Henrique Bartsch, no início dos anos 2000, do encontro recente com Bárbara e sobre a reedição do livro, feita por sua editora (Garota FM Books). Um dos artistas locais que ajudaram a recuperar o Theatro Pedro II após o incêndio que o deixou fechado por 16 anos, Henrique Bartsch passou mais de três anos conversando com Rita Lee por e-mail antes de escrever o livro. O encontro contou ainda com participação do fotógrafo Délfico Marques, estudioso da linguagem iconográfica das capas de discos.
Poesia e sonho
Outro encontro que movimentou o auditório da Biblioteca Sinhá Junqueira foi com a poeta Natasha Félix. Processos de escrita e sonhos foram temas colocados na roda de conversa, que começou com a referência à sua própria família, onde o lado materno era formado por professoras e lado paterno por analfabetas. O processo de escrita do seu livro “Use o alicate agora” também foi abordado. Para Natasha, o poeta é diferente do escritor porque, o segundo, tem a necessidade de ter um livro. “O poeta lida com a palavra de outro jeito, sem depender dela escrita. Você fala o poema e palavra falada é mais poética e mais visceral do que um material físico”, ponderou.
Tenda Sesc
Graciliano Ramos foi tema de bate-papo na Tenda do Sesc. O escritor Edilson Dias de Moura e o ator Eduardo Silva abordaram as diferentes facetas do autor brasileiro, a partir do livro “Graciliano: romancista, homem público e antirracista”, de autoria de Moura. A conversa ainda teve leituras de textos extraídos do livro de Edilson e partilhamento da história do autor, que começou a ler aos 29 anos, justamente com livros de Graciliano Ramos. “Foi esse início do meu percurso na leitura que culminou na minha formação na Faculdade de Letras na USP, um sonho que eu tinha desde criança, quando morava próximo à universidade”, contou Edilson Moura.
O texto “Angústia”, escrito por Ramos nos anos 1930, quando foi injustamente preso, também foi lido. “Aconteceu com Ramos e acontece com grande parte de nós, não brancos, em meio à falsa abolição que vivemos. E a partir do momento em que não nos incomodamos com isso, nos tornamos coniventes com o racismo e a escravidão”, finalizou o ator Eduardo Silva.
Visita oficial
Nesta segunda-feira, a FIL teve também a visita da secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, Marília Marton. Ela ressaltou a relevância da economia criativa no contexto da educação e da literatura e explicou que essa forma de produção está presente em todos os segmentos culturais. “A cultura, muitas vezes, é vista apenas como o que acontece no palco ou como a ação final. Mas o envolvimento desse setor na cadeia produtiva da indústria criativa gera uma economia significativa", afirmou. Marília também destacou a importância da realização de eventos como a FIL e que o papel da Secretaria é justamente mostrar como a indústria criativa contribui para a geração de renda e riqueza, além de promover o desenvolvimento humano. “A cultura é importante fonte de riqueza e desenvolvimento econômico, seja por meio do trabalho de grandes indústrias audiovisuais ou pequenos empreendedores de feiras. Todos têm papel fundamental nesse processo e a presença de crianças aprendendo. A participação de entidades como o SESC demonstram isso na prática”, finalizou Marton.
Organizada e realizada pela Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto, a 23ª Feira Internacional do Livro de Ribeirão Preto segue até o próximo domingo (11/8), e a programação completa você confere no endereço www.fundacaodolivroeleiturarp.com.
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